Não é estranho o fato de dependermos de objetos e de criaturas mirabolantes na Terra. O que é realmente estranho é o nosso comportamento diante de tais coisas, à o que nos submetemos e até que ponto nos tornaríamos mais materialistas apenas para sermos mais que os outros. Isso me irrita, é ruido pra os meus ouvidos.
Em meu mundo nada perdia seu valor, a natureza exuberante e os seres inimagináveis nunca perdiam a essência que os mantinha vivos, nunca as perdia.
É absolutamente incrível como os valores se perdem, permutam ou simplesmente deixam de ser valores. Passei muito tempo sendo o que as pessoas queriam que eu fosse e não o que eu era e sempre fui de verdade.
Minha essência se encontrava inerte, esperando apenas ser movimentada e eu notava que as coisas que realmente me importavam eram exatamente o que fazia parte de mim, o meu verdadeiro "eu". Um "eu" sem necessidades materialistas, constituído apenas de sentimentos que me inundavam em expectativas pra continuar trilhando o caminho que eu precisava seguir. Um caminho que eu, até então, não conhecia.
Minhas experiências sobrenaturais estavam me preocupando. Julgava ser o estresse após noites mal dormidas, talvez tenha sido... durante um tempo.
_Fuja daqui! Eles não podem ver que você fez a passagem!
Acordei suado, confuso...Aquelas palavras... o terreno, o caminho que havia percorrido até em casa. Nada disso tinha sentido, não poderia ter explicação...a única coisa que eu tinha certeza era de que as evidências de algo que eu não sabia da real existência me perturbavam e a voz do meu pesadelo ecoava no meu interior.
Quando não estamos satisfeitos ou felizes com um determinado destino que a vida nos julga sermos dignos, procuramos outros meios, pessoas, atividades e formas para apoiarmos nossa pequena felicidade sem sabermos o que realmente é a felicidade. Gostava de acreditar que eu apoiava a minha felicidade no meu futuro, talvez porque tudo que eu tinha e almejava do interior de minha alma era ele, no presente eu sofria pelos açoites do passado e tudo que me restou era meu futuro.
Depois de 2 aulas seguidas de história só me restava descansar no meu quarto após o almoço que correu como todos os dias, mudo, morto. Sentia dores no corpo o que podia ser uma recepção à gripe que eu não tava disposto a dizer "Olá". Deitei em minha cama e fiquei pensando no que seria bom, no que é bom... e porque tudo ocorre sem ao menos estarmos um pouco preparados, mas não importava porque eu já havia decidido lutar com o que quer que fosse pra eu ser feliz, todos nós precisamos de um pouco de felicidade para continuarmos podendo sofrer rindo ou chorando durante toda nossa vida. Com esse pensamento dormi poucos instantes que esvaíam-se como longas horas.
Flutuei, senti meu corpo ficando pesado e eu leve, não tinha controle dos meus braços ou pernas como da outra vez, mas dessa vez não fiquei com medo, apenas deixei fluir...deixei-me voar pela primeira vez ao som de misteriosamente profundas, mas calmas vozes que diziam: Não tenha medo... não tenha medo... você está seguro agora. As súplicas para que eu me acalmasse não surtiram o efeito que o portador da voz esperava, mas eu tentei, juro que tentei esquecer-me de todos os problemas e do medo para que eu estivesse sendo guiado pela primeira vez por Deus. Estava sendo guiado sim, mas não por Deus... estava sendo guiado por uma linda mulher que possúia uma tez incrivelmente brilhante, cabelos azuis e olhos expressivamente negros, portando roupas nada convencionais e que cantarolava pra mim até chegarmos na mesma árvore que outrora havia me dado um abraço em troca da minha calma. Dessa vez não havia medo nem lágrimas, só havia eu, ela e a árvore...permiti-me deixar levar por ela até as raízes do exuberante monumento da natureza e, ao chegarmos, a linda mulher de cabelos azuis usou uma linguagem a que me parecia Latim, a língua morta. Passando as suas mãos sobre as raízes e o caule, ela disse: Patefacio radix te lux ultima potest redire ad deos. E com um barulho que se tornou ensurdecedor gradativamente a árvore se abriu, dando forma à uma enorme porta que se abriu lentamente ofuscando meus olhos. A linda mulher ofereceu sua mão, que possuía a textura das sedas mais nobres, e eu a segurei e ao passarmos pela porta não estávamos mais no chão e sim sob o céu azul intenso que dava destaque a um Sol incrivelmente lindo e que tinha sua beleza refletida num extenso lago com uma forma a qual eu não havia aprendido nas aulas de Geometria. Sobrevoávamos uma extensa floresta com flores que pareciam dançar à simples sinfonia do vento que tintilhavam suas pétalas, de cores diferentes e fortes, misturas que não conhecia até então. As árvores pareciam nos recepcionar retorcendo-se a medida que nos aproximávamos... (Continua...)